Pessoal, esse texto foi uma reportagem que um jornal carioca publicou sobre o assunto e eu e um colega médico fomos convidados para dar informações médicas para enriquecer a reportagem. O tema é bem interessante e atual, por isso publico aqui:
“Assistir televisão de óculos escuros, evitar ambientes com ventiladores ligados, e, ainda assim, “chorar” bastante. Essa foi parte da rotina de Maria Domingas Cardoso Sousa na última década. Com atuais 61 anos, Madô, como gosta de ser chamada, conviveu com um distúrbio que muitos brasileiros sofrem, mas poucos sabem nomear. A Epífora, vulgarmente conhecida como “olhos lacrimejantes”, é uma das principais queixas de pacientes em diversos consultórios do país e o caminho para descobrir a real causa do problema pode levar algum tempo.
No Caso de Maria Domingas, as lágrimas começaram a cair de forma involuntária por conta da idade e pela ação solar. Segundo o seu médico, o oftalmologista especializado em plástica ocular, Márcio Ferreira Luz, um dos incômodos oculares mais frequentes em pessoas de idade é o excesso lacrimal causado pela flacidez da pele e frouxidão dos tendões palpebrais. Por consequência, ambientes com luz forte, vento e grande esforço visual para perto, acabam incomodando e ajudam a piorar o problema.
Por conta dos efeitos do escoamento excessivo de lágrimas, Madô resolveu operar em dezembro do ano passado. De acordo com ela, muitos médicos não entendiam o problema e passavam apenas um colírio, que acabava não adiantando nada.
—Tentei vários médicos até encontrar o doutor Márcio, que optou pela cirurgia e resolveu o problema. Era muito chato conviver com isso o tempo todo. Toda vez tinha que fazer alguma coisa na rua, muita gente me parava perguntando se estava tudo bem, já que pensavam que eu estava chorando.
Para Juliana de Sá Freire Medrado, especialista em cirurgia oculoplástica, vias lacrimais e órbita, as principais queixas dos pacientes são o embaçamento da visão, uma vez que a lágrima interfere na refração da luz, e a necessidade de enxugar a região dos olhos como frequência, ato que por vezes implica em lesões na pele, podendo gerar alteração da coloração do local.
—Fora isso, há o incômodo de ter que explicar constantemente porque está “chorando”. É uma situação que cria um constrangimento social muito grande.
Ainda segundo Juliana, é possível dividir as causas em duas categorias: as agudas, fruto do excesso de produção de lágrimas devido à presença de corpos estranhos, processos alérgicos, infecciosos e olho seco; e as que acontecem por conta de dificuldade de drenagem, decorrente da obstrução das vias lacrimais ou de anormalidades no posicionamento das pálpebras.
—A maioria das crianças nasce com o canal lacrimal obstruído e é através de massagens concentradas na face que essas vias vão ficando com o fluxo correto e aberto. Em outros casos, quando massagear não é o suficiente, o bebê precisa passar por uma pequena cirurgia de desobstrução do canal — afirma.
A Coordenadora de Mídia Patrícia Silvério, hoje com 31 anos, apesar de não lembrar do fato em questão, passou por isso quando ainda era amamentada.
—Tive que operar porque vazava muita lágrima dos meus olhos e eu não conseguia abri-los quando acordava. Formava muita secreção e minha mãe passava um algodãozinho molhado para limpar. A secreção ficava dura e acabava me machucando muito. Hoje continuo chorando bastante, mas porque sou emotiva. A lágrima desce por onde tem que descer – brinca.
Francisco Pithon passa pelo mesmo problema. O diretor de cinema da Enquadra Filmes, que também está com 31 anos, se “afoga” em suas próprias lágrimas 24 horas por dia. Segundo ele, este problema o persegue desde que nasceu.
—Fui uma vez no médico para resolver isso e parece que eu não tenho o canal para sair lágrima, o meu é entupido, não tenho o “ralo” para escoar minha produção de líquido nos olhos. Eu já perdi a conta, mas devo ter feito o movimento de limpar minhas lágrimas milhões de vezes na vida.
Ainda de acordo com o diretor, o desconforto é sentido quando é preciso olhar para baixo.
—Quando olho para o chão, acabo vendo tudo disforme por conta do acúmulo da lágrima. As pessoas também me perguntam se estou chorando quando ando pelas ruas. Acredito que minhas olheiras são frutos do ato de secar repetidamente os olhos.
Para Francisco, a indicação médica foi realizar uma cirurgia de correção do problema, mas o cineasta adia o quanto pode.
—Não fiz até hoje. Tenho medo de complicações. Minha avó materna tinha o mesmo problema quando nasceu e meu pai também.
O Oftalmologista cooperado da Unimed-Rio, Jaime Guedes, afirma que pode existir uma predisposição para o problema, mas que o principal fator, em casos agudos, irá variar com a causa específica da abundância de lágrimas. A qualidade do ar em que o paciente está sendo submetido, é um dos pontos, por exemplo.
Segundo o médico, os olhos que lacrimejam em excesso estão paradoxalmente ligados, em alguns casos, ao ressecamento dos olhos.
—Pessoas que passam o dia trabalhando no computador acabam involuntariamente piscando menos e tornando o filme lacrimal mais instável.
Como primeira medida para combater o problema, o especialista em Segmento Anterior – superfície frontal da córnea – indica que o paciente deve procurar um médico para um diagnóstico correto da causa, oferecendo assim, o melhor tratamento.
Este é o próximo passo na vida da Diretora de Arte Isabela Azevedo. Sofrendo com o excesso de lágrimas que escorrem pelo seu rosto desde 2012, a jovem de 23 anos se sente, muitas vezes, inibida com o que os outros iriam pensar.
—Muitas vezes me sentia mal porque começava a “chorar” e as pessoas poderiam pensar que estava emocionada. Uma vez eu estava com minha orientadora de monografia da faculdade e comecei a lacrimejar enquanto falava sobre o tema do trabalho. Foi um pouco constrangedor. Ultimamente tenho sentido um incômodo constante, como se tivesse algo nos olhos, por isso penso em procurar ajuda médica – conta.
No consultório do doutor Arlindo Portes, oftalmologista e professor do curso de Medicina da Estácio de Sá, cerca de 20% de seus pacientes reclamam de olhos ressecados, sendo esta a principal causa do lacrimejamento em excesso.
Para ele, a incidência do problema no verão tende a ser maior devido ao aumento de casos de olho seco, já que o clima quente ajuda na evaporação da lágrima, além dos casos de conjuntivite, que tendem a aumentar.
De acordo com José Alvaro Gomes, membro do Conselho Brasileiro de Oftalmologia, o aumento da retenção lacrimal pode ocorrer também pela obstrução da via de drenagem naso-lacrimal, que faz o trabalho de drenagem das lágrimas até o nariz – por isso o nariz de quem está chorando fica escorrendo.
Segundo ele, cada caso é muito particular, tendo o problema diversas causas possíveis.
—A obstrução pode ser congênita, pelo atraso da reabsorção de uma membrana que fecha o sistema e que costuma abrir após os primeiros meses de vida. Pode ser mecânica, que geralmente ocorre mais tardiamente e também podem ocorrer após trauma na região. As obstruções podem evoluir para infecção e nesse caso o tratamento passa a ser com uso de antibióticos tópicos e sistêmicos – finaliza.”